
Está a tentar engravidar mas ainda não chegou o seu momento? Será um sinal de infertilidade? Ou é apenas o corpo que ainda não está preparado para este novo passo? Para esclarecer estas dúvidas, o Notícias Saúde entrevistou Isabel Torgal, diretora clínica e médica especialista em Ginecologia/Obstetrícia com subespecialidade em Medicina da Reprodução na clínica Ferticentro.
A verdade é que o stress diário, o sedentarismo, uma má alimentação e o uso de tecnologias não são amigas da fertilidade! Para juntar aos fatores externos, a partir dos 30 anos e dos 40 anos, a fertilidade feminina e masculino, respetivamente, começa a diminuir.
Mas nem tudo são más notícias! Saiba o que pode mudar na sua rotina para manter a sua fertilidade viva e saudável e, caso pretenda engravidar mais tarde, pode ainda haver uma solução: a criopreservação.
A partir de que idade a fertilidade começa realmente a diminuir, tanto em mulheres como em homens?
A fertilidade feminina começa a decrescer de forma gradual a partir dos 30 anos; no entanto, verifica-se uma diminuição muito rápida e acentuada a partir dos 35, embora seja variável de mulher para mulher. No caso do homem, o processo é muito mais lento e é iniciado por volta dos 40 anos, desconhecendo-se o ritmo desta involução.
Que hábitos de vida afetam a fertilidade naturalmente?
Há hábitos de vida que afetam a fertilidade em ambos os sexos, entre os quais:
- O consumo de álcool e tabaco;
- A exposição a toxinas, substâncias químicas, radiações, pesticida e poluentes ambientais — quer em ambiente natural, quer no âmbito profissional (profissionais de imagiologia, farmacêuticos, técnicos de laboratório, etc.);
- O estado geral de saúde;
- Uma alimentação inadequada;
- A toma de medicação sem vigilância médica;
- Um Índice de Massa Corporal (IMC) fora dos valores recomendados.
Na mulher, em particular, a prática de exercício físico de alta competição pode provocar alterações menstruais graves que podem conduzir a anovulação. Por outro lado, a falta de exercício também pode ser nociva ao favorecer o aumento de peso e, potencialmente, a obesidade.
No homem, em particular, a exposição prolongada a temperaturas elevadas na região testicular (como acontece, por exemplo, com padeiros, condutores de pesados de longo curso, ou pela utilização de roupa interior demasiado justa) pode provocar alterações graves a nível espermático, bem como a utilização de esteroides, com objetivo de aumentar a massa muscular, frequentemente associado à prática de exercício físico em ginásio.
O stress, o sedentarismo ou o uso de tecnologias (como o telemóvel no bolso) têm o mesmo impacto?
O stress pode afetar a fertilidade em ambos os sexos, na medida em que pode provocar alterações hormonais, ainda mal definidas, mas que, no limite, podem conduzir à anovulação na mulher e a uma diminuição dos níveis de testosterona no homem.
O sedentarismo pode provocar alterações a diversos níveis que vão afetar a fertilidade. Está frequentemente associado ao aumento de peso e à obesidade, que afetam negativamente a fertilidade, além do impacto que tem na saúde em geral, aumentando o risco de diabetes e de doenças cardiovasculares. No caso das mulheres, pode ainda contribuir para alterações importantes na fisiologia do ovário.
O uso do telemóvel no bolso e computador portátil no colo deve ser evitado, pelo efeito nefasto da radiação emitida por estes dispositivos, que pode afetar negativamente a qualidade do esperma.
O que se pode fazer para não prejudicar a fertilidade?
Os principais hábitos são:
- Manter um estilo de vida saudável e uma alimentação equilibrada;
- Promover cursos de educação sexual, com o objetivo de prevenir relações sexuais desprotegidas e de risco, de modo a evitar infeções sexualmente transmissíveis (DST), que podem comprometer de forma irreversível a fertilidade;
- Ter especial atenção a bebidas oferecidas em ambientes descontraídos, não apenas pelos efeitos do álcool, mas também pela possibilidade de ingestão inadvertida de drogas;
- Se não for possível uma gravidez até aos 35 anos, considerar a criopreservação de ovócitos.
Muitas pessoas acreditam que a infertilidade é “só um problema feminino”. Isto é verdade?
Não, isso não é verdade! Não acredito que, nos dias de hoje, ainda persista a ideia de que este é apenas um problema feminino. Trata-se de uma conceção ultrapassada, enraizada em estereótipos antigos e machistas, originada pelo facto de ser a mulher quem engravida e dá à luz, o que, no passado, levava a atribuir-lhe toda a responsabilidade quando a gravidez não acontecia!
Como distinguir entre “demorar a engravidar” e um verdadeiro problema de infertilidade?
Infertilidade define-se como uma situação em que um casal jovem e saudável, tendo a mulher menos de 35 anos, mantém relações sexuais desprotegidas e frequentes há cerca de um ano e meio e não consegue uma gravidez.
“Demorar a engravidar” é uma situação temporária em casais com as características acima definidas, em que, apesar dos resultados dos exames complementares de diagnóstico se encontrarem nos parâmetros considerados normais, a gravidez não acontece. Nestes casos, normalmente, a gravidez acaba por ocorrer de forma espontânea ou com recurso a uma intervenção médica mínima.
Com a evolução da medicina já é possível planear uma gravidez tardia, que conselhos daria aos casais jovens que querem preservar a fertilidade?
O primeiro passo é manter — ou iniciar — um estilo de vida saudável e, após confirmarem que todos os parâmetros necessários para uma futura gravidez se encontram nos valores normais, considerarem a criopreservação de ovócitos, idealmente antes dos 35 anos, tendo em conta a diminuição natural da fertilidade com o avançar da idade.
A criopreservação de esperma também deve ser considerada, não apenas devido ao fator idade, mas também como uma precaução de eventuais situações futuras que possam prejudicar a fertilidade masculina.