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Associações de doentes com fibrose quística reagem a posição do Infarmed

fibrose quística

O apelo de Constança Braddel, doente com fibrose quística, para lhe ser facultado o acesso ao medicamento Kaftrio, gerou uma onda de solidariedade nas redes sociais. Face à pressão da opinião pública, o Infarmed divulgou um comunicado ao qual a Associação Nacional de Fibrose Quística (ANFQ) e Associação Portuguesa de Fibrose Quística (APFQ) se veem na obrigação de responder.

O Infarmed salienta que em 2021 foram aprovados dois medicamentos inovadores para o tratamento desta doença, o que é um facto. No entanto, omite que estes são os dois primeiros medicamentos que surgiram e que demorou cinco anos a avaliá-los, ultrapassando largamente o prazo legal para o fazer.

Os medicamentos que foram aprovados este ano são os mais antigos e com menor abrangência e eficácia de todos os que já surgiram. Além disso, o Infarmed ainda nem sequer aprovou o medicamento anterior ao Kaftrio. 

O Infarmed afirma que não é insensível a situações como a da Constança, estando sempre disponível para autorizar o acesso ao medicamento por AUE/ PAP.

Se o fosse, o processo do Kaftrio estaria já concluído, afirmam as associações que representam os doentes, e os medicamentos inovadores anteriores ao Kaftrio não teriam demorado cinco anos a ser avaliados, ou não estariam ainda por aprovar.

É do conhecimento geral que a fibrose quística é uma doença degenerativa e que a progressiva destruição dos pulmões culmina numa insuficiência respiratória fatal. Como tal, para evitar situações dramáticas como a da Constança, é necessário prevenir a progressão da doença com o acesso ao Kaftrio antes de estar em fase tão avançada.

“Sensibilidade implica envidar esforços para evitar que a fibrose quística evolua de forma tão dramática, e não tentar remediar com AUE/PAP a degeneração que se tem permitiu que ocorresse. Além disso, como o AUE/PAP apenas é facultado num estado clínico muito grave da doença, o Kaftrio já não é capaz de resolver os danos pulmonares irreversíveis com os quais o paciente terá de viver durante a vida que lhe restar”, lê-se no comunicado das associações, que consideram inaceitável esta espera.

“Não podemos esperar mais. A progressão da doença manifesta-se de forma muito acelerada a partir de um certo ponto. É preciso impedir que os pacientes cheguem a esse ponto irreversível. A seguir à Constança, outras ‘Constanças’ virão.”

Há muitos meses que as associações ANFQ e APFQ têm sensibilizado o Infarmed para a urgência do acesso generalizado ao medicamento Kaftrio e para conclusão de todos os processos de avaliação para financiamento público pendentes.

As associações têm denunciando o atraso de Portugal em relação aos outros países da União Europeia e, em novembro passado, lançaram mesmo um apelo público a todas as entidades competentes para que fossem tomadas as medidas excepcionais necessárias para um acesso generalizado imediato às terapias inovadoras para a fibrose quística em Portugal.

No fim de janeiro, o movimento Fibrose Quística Portugal entregou na Assembleia da República a petição ‘Acesso imediato ao Kaftrio® para pacientes com Fibrose Quística em Portugal’, com 18.000 assinaturas. Após a exposição pública de Constança Bradwell, a petição, ao momento deste comunicado, já ultrapassou as 57.000 assinaturas.

O medicamento de que tanto se fala para a fibrose quística

O que é o Kaftrio? É um medicamento inovador, capaz de evitar a morte precoce de muitos doentes com fibrose quística, aprovado pelo FDA em 2019 e pela EMA em Agosto de 2020.

Faz parte da classe dos primeiros medicamentos dirigidos à causa da doença, medicamentos estes que mudaram o paradigma do tratamento – passamos de tratamentos que controlavam e minimizavam os sintomas, para um tratamento que corrige parcialmente o defeito e atrasa ou evita o aparecimento desses sintomas.

Trata-se de um medicamento único na fibrose quística, capaz de atrasar ou evitar transplantes pulmonares, prolongando a vida destas pessoas, tornando-a numa vida com qualidade.

O que é uma AUE ou um PAP? AUE significa Autorização de Utilização Excecional e PAP significa Programa de Acesso Precoce. São mecanismos de acesso a medicamentos que podem ser utilizados enquanto estes não estão aprovados para efeitos de financiamento público pelo Infarmed.

Esses mecanismos de acesso são apenas para pacientes com características específicas de gravidade da doença. De uma forma simples, apenas doentes muito graves, que corram risco importante de vida ou de necessidade de transplante pulmonar podem entrar neste tipo de programas de acesso. Não é um programa de acesso generalizado para todos os doentes elegíveis. 

Quais os passos no processo de avaliação de um medicamento em Portugal? Os medicamentos passam, todos, por uma fase de avaliação fármaco-terapêutica, que avalia a eficácia clínica do medicamento e a sua segurança.

Entram depois por uma fase de avaliação fármaco-económica, em que se avalia o custo-benefício do fármaco, tendo em conta as particularidades do país. Por fim, vem a fase de negociação do preço do medicamento com a empresa farmacêutica.

Historicamente, estes passos são lentos e demorados, particularmente nos medicamentos inovadores e medicamentos órfãos (medicamentos dirigidos a doenças raras). O preço do Kaftrio, em Portugal, ainda não é conhecido. Os preços negociados variam de país para país.

O que aconteceu noutros países europeus em relação ao Kaftrio? Houve flexibilidade nestes processos burocráticos. Face à existência de um medicamento novo, claramente eficaz, benéfico para muitos doentes e sem alternativa no mercado, houve preparação e flexibilidade nos processos de avaliação dos mesmos.

Em alguns países, saltaram-se etapas nos processos de avaliação, a negociação do preço foi feita previamente ou em paralelo com o processo de avaliação, permitindo agilizar o processo.

Na Alemanha e no Reino Unido, por exemplo, o foco no doente fez com que, logo após a aprovação do Kaftrio pela EMA, ele estivesse disponível para todos os doentes elegíveis.

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