Da fábrica da Fresenius Kabi, em Santiago de Besteiros, Tondela, saem todos os anos 100 milhões de unidades de medicamentos genéricos. No Open Industry Day, as portas da unidade 5 abriram-se para uma visita que mostra como Portugal pode também ser competitivo nesta área, com um debate que deixa o alerta: a pressão sobre os preços está a fazer desaparecer medicamentos do mercado.
Espalhada por uma área de seis mil metros quadrados, a fábrica divide-se em unidades. Na número 5, os pequenos fracos transparentes, que começam o processo vazios, seguem uma linha de montagem onde as máquinas e a mão humana se juntam para proporcionar aos doentes o tratamento de que necessitam.
As regras de segurança são apertadas, ou não fosse de vidas que se fala no se refere à medicação ali produzida. Para evitar a contaminação, é na própria unidade que se armazenam os materiais utilizados para o fabrico dos fármacos.
A tecnologia é de ponta e os cuidados são muitos, assim os procedimentos e regras a seguir, para que 34 milhões de produtos saiam anualmente desta linha destinados a quem deles mais precisa.
“Esta fábrica é um exemplo de sucesso da indústria nacional”, confirma Glenn Luís, diretor geral da Fresenius Kabi Portugal, que partilha números que o confirmam: são, ao todo, 600 as pessoas que ali trabalham, responsáveis pela produção anual de 100 milhões de unidades de medicamentos, exportados para 70 países.
O desafio do envelhecimento
Inserida numa iniciativa da Medicines for Europe, a associação que representa as indústrias farmacêuticas europeias de medicamentos genéricas e biossimilares, e da APOGEN – Associação de Medicamentos Genéricos e Biossimilares, a visita à Fresenius Kabi serviu ainda para discutir os principais desafios que estes medicamentos enfrentam hoje e o seu papel no futuro da sustentabilidade em saúde.
Sobretudo tendo em conta, como refere Paulo Lilaia, vice-presidente da APOGEN, o que revelam as projeções demográficas: “em 2030, Portugal terá quase 2,5 milhões de idosos, o que impactará significativamente a despesa do Serviço Nacional de Saúde”.
Para o especialista, a questão é simples: “Como se vão dar condições de saúde a esta população, sendo mais eficientes, com menor custo, mas mantendo a qualidade?”
Para a resposta, mais complicada, contribuem os medicamentos genéricos e biossimilares. Só em ambiente hospitalar, reforça Lilaia, “75% dos medicamentos consumidos são off-patent”. Uma dimensão que é inversamente proporcional aos gastos. Aqui, acrescenta, “impactam apenas 26% da despesa”.
“Entre 2011 até julho de 2019, os medicamentos genéricos, só em regime ambulatório, geraram para o Estado e utentes poupanças superiores a 3.639 milhões de euros. Os medicamentos genéricos e biossimilares desempenham um papel fundamental no desenvolvimento de um sistema de saúde sustentável ao proporcionarem melhores resultados em saúde e uma maior eficiência dos cuidados de saúde ao serviço dos doentes”, acrescenta.
Rui Santos Ivo, presidente do Infarmed, concorda com a importância do papel dos genéricos, salientando o “espaço que criam para o acesso à inovação e as economias para incorporar essa inovação”.
O risco da insustentabilidade
Presente no debate sobre as melhores formas de impulsionar a excelência em Portugal para mais e melhor saúde na Europa, o presidente do Infarmed salienta o caminho percorrido pelas políticas de genéricos, concordando que ainda há trabalho a fazer, sobretudo no que diz respeito à resolução de um problema que tem sido recorrente: a falha de medicamentos.
De acordo com Paulo Lilaia, a pressão sobre o preço dos medicamentos pode ajudar a justificar estas falhas. “A indústria farmacêutica tem obrigação de fabricar medicamentos com qualidade e de os disponibilizar a preços mais baixos. Mas não se podem fabricar medicamentos a custo zero.”
Esta pressão, reforça, faz com que a manutenção de alguns medicamentos genéricos no mercado se torne “insustentável, fazendo com que desapareçam do mercado”, alerta.
Motivos que levam Marc-Alexander Mahl, vice-presidente da Medicines for Europe, a reforçar a necessidade, a nível da União Europeia, “de políticas de saúde sustentáveis, incluindo uma ambiciosa estratégia industrial farmacêutica que ofereça um acesso equitativo e sustentável dos doentes aos medicamentos. Além disso, precisamos de uma resposta pan-europeia para os próximos desafios, como escassez de medicamentos, digitalização e resistência antimicrobiana”.
Mercado dos genéricos continua a crescer
O mercado de genéricos, assim como o de biossimilares tem vindo a crescer no País. No fim do terceiro trimestre deste ano, e comparando com o período homólogo, a cota de mercado dos genéricos encontrava-se, segundo Rui Santos Ivo, nos 48,7%, o que corresponde “a uma evolução positiva, ainda que não tão acentuada como até então”.
O objetivo do Governo é, partilha, “manter o foco no uso de genéricos e biossimilares”.