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Infertilidade masculina está presente em 50% dos casos, mas continua rodeada de estigma

infertilidade masculina

Durante muito tempo encarada como uma responsabilidade feminina, a fertilidade há muito que deixou de ser apenas um problema das mulheres. Os números são claros: o fator masculino surge isoladamente em 20% dos casos de infertilidade e como cofator em 30 a 40% das situações. Ou seja, metade dos casais inférteis enfrenta um contributo masculino para o problema, refutando a ideia de que o problema é exclusivo do sexo feminino. Uma alteração que traz consigo vários desafios.

“Felizmente, assistimos claramente a uma mudança de paradigma, lenta, mas sólida e que assume a questão da infertilidade como questão do casal, sublinhando a necessidade de envolver ambos os elementos na investigação e tratamento do problema”, confirma Nuno Louro, médico especialista em Urologia e subespecialista em Andrologia, da Procriar.

No entanto, alerta para o facto “da sexualidade e a paternidade serem dos pilares mais fortes em que assenta a ideia da masculinidade”, pelo que, “quando abalados, todo o edifício fica em risco de ruir. É importante que os homens percebam que ser infértil não os define como pessoa nem como homens e que é apenas uma condição médica que, juntos, tentarão ultrapassar”.

“O diagnóstico de infertilidade tem um impacto significativo na saúde mental do homem, independentemente de a causa estar associada a fatores femininos ou masculinos”, refere Leonor Neves, psicóloga clínica da Procriar.

“No caso específico da infertilidade masculina, vários estudos demonstram que os homens com infertilidade apresentam níveis mais elevados de depressão e ansiedade, assim como pior qualidade de vida, quando comparados com homens considerados férteis.” E porque é geralmente a mulher quem é submetida a técnicas de procriação medicamente assistida mais invasivas e desconfortáveis, “o foco está na mulher e é comum que os homens reportem sentimentos de irrelevância ou exclusão do processo”.

Não só isto, mas “fertilidade e masculinidade estão também intimamente relacionadas – as construções sociais associadas à masculinidade tendem a exigir que o homem seja fértil, forte, e emocionalmente contido”. O que significa que “a infertilidade masculina é percecionada como uma forma de «masculinidade inferior». Assim, um diagnóstico de infertilidade pode dificultar a capacidade de o homem reconhecer e lidar com a própria dor, ou expressar medos e vulnerabilidades, forçando-o a reconstruir a sua identidade masculina”.

A tudo isto junta-se ainda a questão da vergonha, que pode impedir o homem de procurar ajuda “devido ao receio de ser considerado menos masculino”. O que torna essencial “manter uma comunicação aberta e constante. Diversos estudos demonstram que os casais que percecionam o seu parceiro como disponível e atento tendem a experienciar níveis mais baixos de ansiedade associada à infertilidade”, explica a médica.

E, “uma vez que a infertilidade masculina está frequentemente associada ao estigma, sentimentos de vergonha e dificuldade em expressar emoções, torna-se particularmente relevante cultivar uma comunicação aberta, empática e honesta no casal. Além disso, é útil procurar vivenciar o processo como um desafio partilhado, em vez de um processo individual”.

A importância de procurar ajuda

São vários os fatores que podem impactar a fertilidade masculina. “Neste campo, destacaria as questões relacionadas com a dieta e o sedentarismo (muitas vezes associadas a obesidade), a exposição a substâncias tóxicas, como o tabaco, o consumo excessivo de álcool e o uso de drogas de abuso. Também a utilização de testosterona ou anabolizantes, em contexto desportivo ou estético, pode ter um impacto muito negativo na saúde reprodutiva do homem”, refere Nuno Louro.

A boa notícia é que os avanços na ciência e medicina permitem dar cada vez mais resposta aos problemas de infertilidade. “Os objectivos da avaliação masculina são a identificação de condições potencialmente reversíveis, de forma a permitir a melhoria da fertilidade e uma potencial concepção espontânea; a identificação de condições irreversíveis, mas em que é possível utilizar os gâmetas do próprio em técnicas de procriação medicamente assistida (PMA); a identificação de condições irreversíveis nas quais não é possível a utilização dos gâmetas do próprio; a identificação de condições clínicas subjacentes potencialmente graves (como as neoplasias do testículo ou da hipófise) e a identificação de condições genéticas que possam afetar a saúde da descendência, no caso de utilização de técnicas de PMA”.

Mas para isso é necessário realizar “uma história clínica e exame físico detalhados, assim como os exames auxiliares de diagnóstico necessários e adaptados a cada situação individual”, explica o médico. Ou seja, é imperativo que procurem ajuda. “Os homens, tradicionalmente, estão menos atentos à sua saúde, têm menos cuidados preventivos e frequentam menos os cuidados de saúde”, alerta o especialista, que considera, por isso, essenciais para uma mudança de atitude, campanhas de consciencialização como o Movember, Mês de Sensibilização para a Saúde Masculina.

Crédito imagem: Unsplash

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