Rose Marie Bentley era uma mulher de armas, mas uma norte-americana como muitas outras. Ou pelo menos assim se pensava. Só depois da sua morte, com 99 anos, é que se descobriu que Rose era diferente e que a sua anatomia era tudo menos típica: Rose tinha todos os órgãos no sítio errado, com exceção de um, o coração.
Rose viveu a maior parte de sua vida adulta perto da cidade rural de Oregon, nos EUA, onde ela e o marido, James Bentley, tinham uma loja de alimentos para animais. Pertencia à Igreja Metodista local, onde cantou no coro, cuidava de um horta que servia para alimentar a família e viajou com o marido para todos os 50 estados do país e fora deste, até à reforma, em 1980.
Decidiu doar o corpo para a ciência, que o recolheu a 11 de outubro de 2017, data em que faleceu e que os estudantes de medicina da Oregon Health & Science University começaram a estudar a sua anatomia.
Rose Marie Bentley viveu 99 anos sem saber que era um caso raro: sofria de situs inversus com levocardia, o que significa que o seu fígado, estômago e outros órgãos abdominais, em vez de se encontrarem do lado direito, estavam todos à esquerda, ainda que o coração permanecesse onde devia, do mesmo lado.
“Demorou algum tempo até percebermos”, explica Cam Walker, o médico e professor de anatomia, que ajudou os estudantes a desvendar o mistério da anatomia de Bentley.
Uma entre muitos milhões
Situs inversus com levocardia ocorre cerca de uma vez a cada 22.000 nascimentos e é frequentemente associado a doenças cardíacas com risco de vida e outros problemas.
Bentley pode mesmo ser sido a pessoa mais velha conhecida com esta condição. Até porque, de acordo com o especialista, estima-se que apenas uma em cada 50 milhões de pessoas nascidas com este problema específico viva o tempo suficiente para chegar à idade adulta.
De acordo com a família de Rose, esta vivia sem doenças crónicas, para além de artrite. Teve três órgãos removidos durante a vida, mas apenas um cirurgião, que lhe retirou o apêndice, registou a sua localização incomum. Nenhum dos cinco filhos de Rose sabia que a minha tinha os órgãos do lado errado e acreditam que ela também não soubesse.
O caso mereceu mesmo um estudo, já publicado e agora apresentado numa reunião científica.