
E se a picada de uma agulha não tivesse que doer? Há um hospital pediátrico que, pela primeira vez em todo o mundo, decidiu abrir guerra à dor, com um projeto destinado a eliminar ou reduzir a dor associada a procedimentos que envolviam o uso de agulhas em bebés e crianças. Uma aposta ganha.
Publicado na revista da Associação Internacional para o Estudo da Dor, a PAIN Reports®, o trabalho é, confirmam Stefan J. Friedrichsdorf, Donna Eull e os colegas do Children’s Hospitals and Clinics, do Minnesota, EUA, “o primeiro relato, em todo o mundo, de uma implementação bem-sucedida do protocolo para reduzir ou eliminar a dor causada pela agulha, incluindo a dor das vacinas, num hospital pediátrico”.
Porque “a dor continua a ser comum, subreconhecida e subtratada em hospitais pediátricos e clínicas pediátricas” e porque, referem, está comprovado que os procedimentos que envolvem agulhas são “a maior fonte de dor e ansiedade para doentes e familiares”, os especialistas decidiram combatê-la no hospital onde mais de 200.000 doentes sentem, todos os anos, a dor da agulha, na sequência de vacinas, exames de sangue, injeções e outros procedimentos.
As quatro estratégias para reduzir a dor
Para dar resposta ao problema, os especialistas em medicina da dor idealizaram um projeto para a melhoria da qualidade de vida dos doentes, através da eliminação ou redução da dor causada pela agulha.
Desenvolvido seguindo a “Promessa de Conforto das Crianças”, o projeto quis “fazer todos os possíveis para prevenir e tratar a dor”.
Para isso, os funcionários foram treinados para, sempre e sem exceção, oferecer quatro estratégias: adormecer a pele com anestésico tópico, dar sacarose (água com açúcar) ou permitir a amamentação em bebés com menos de 12 meses, permitir posições de conforto (deixar as crianças sentarem-se ao colo dos pais), sem nunca agarrar ou restringir os movimentos dos mais pequenos e usar distrações apropriadas à idade (brinquedos, livros, jogos, smartphones, realidade virtual).
Os resultados
Entre 2014 e 2016, o projeto foi implementado, de forma faseada, em todo o hospital e clínicas. Como o uso das quatro estratégias aumentou, a satisfação dos doentes melhorou significativamente.
De acordo com os dados, as famílias que sentiam que a dor de seu filho era “sempre bem controlada” aumentaram de 60 para 72%.
O acompanhamento sugeriu que as estratégias de redução da dor nos bebés tinham outras vantagens, como uma redução do tempo, em comparação com o tempo gasto com o conforto dos mesmos após o uso de agulhas.
“A ‘Promessa de Conforto das Crianças’ tornou-se o novo padrão de cuidados da nossa instituição”, referem Friedrichsdorf e os colegas.
Estratégias que estão agora a ser introduzidas noutros quatro hospitais infantis da América do Norte (Montreal, Toronto, Kansas City e Atlanta).
Controlo desadequado da dor
Segundo Christine T. Chambers, especialista do Centre for Pediatric Pain Research, este trabalho representa uma aplicação “real” de estudos para melhorar a resposta dada à dor pediátrica.
Resposta que tem feito “um progresso enorme” desde os anos 1970 e 1980, altura em que se acreditava que os bebés não podiam sentir dor e não deveriam receber anestésicos.
No entanto, “o controle desadequado da dor continua a ser relatado em crianças que sofrem procedimentos dolorosos, após a cirurgia e no contexto da dor crónica”.