As principais causas do cancro do fígado são bem conhecidas: pode ser de origem viral (hepatite B e C), causado pelo abuso de álcool ou associado à doença esteato-hepatite não alcoólica, que se caracteriza pela acumulação de gordura no fígado, resultando numa inflamação crónica. Mas num estudo recente, uma equipa internacional de cientistas revela que as causas do cancro do fígado estão a mudar – e o prognóstico é misto.
Por um lado, o positivo, os avanços nas vacinas contra a hepatite B e a maior disponibilidade de tratamentos antivirais reduziram o número de casos de cancro do fígado associado a este problema. Por outro, o negativo, o consumo de álcool e a prevalência de obesidade (outro fator de risco) estão a aumentar dramaticamente.
“O impacto destas mudanças na carga global de cancro do fígado não é ainda claro”, refere o autor sénior deste estudo, Rohit Loomba, diretor do serviço de hepatologia da UC San Diego Health e professor de medicina na UC San Diego School of Medicine.
Mas há uma coisa que não mudou: o cancro do fígado continua a matar, sendo a terceira principal causa de morte por cancro no mundo. Só em 2020, mais de 830.000 pessoas perderam a vida para a doença.
Os novos inimigos do cancro do fígado
Loomba e os colegas verificaram que entre 2010 e 2019 houve um aumento de 27% nos casos de cancro do fígado nos 204 países avaliados, um aumento de 25% nas mortes pela doença e um aumento de 21% nos anos de vida ajustados por incapacidade (DALY), uma estatística que tem em conta os efeitos adversos da doença além da morte – um DALY é a perda equivalente a um ano de saúde plena.
A prevalência do cancro do fígado é desigual em todo o mundo. Em 2019, por exemplo, as taxas de mortalidade foram mais altas na Ásia (incluindo em países como China, Japão, Tailândia e Mongólia) e mais baixas na maior parte de África.
As causas deste tipo de tumor também não são iguais, com as taxas de mortalidade padronizadas por idade devido ao cancro do fígado associado à hepatite B a diminuírem entre 2010 e 2019, provavelmente devido a campanhas de vacinação bem-sucedidas e tratamentos antivirais.
A única região onde aumentou foi nas Américas, possivelmente devido ao subdiagnóstico de casos de cancro do fígado e falta de sensibilização para a doença, escreveram os autores. Os casos associados ao vírus da hepatite C também diminuíram devido à disponibilidade de tratamento antiviral oral altamente eficaz, exceto nas Américas.
A a doença esteato-hepatite não alcoólica foi a causa de morte por este tipo de tumor que mais cresceu em todo o mundo, sobretudo nas Américas, impulsionada pelo rápido aumento das taxas de obesidade e acredita-se que vá crescer ainda mais nos EUA, Europa e Ásia nos próximos 10 anos, acompanhando o aumento das taxas de obesidade.
O álcool foi a segunda causa de cancro do fígado que mais cresceu, novamente com o maior aumento nas Américas. Estima-se que o consumo global de álcool per capita aumente ainda mais, sobretudo nos países do Pacífico Ocidental e do Sudeste Asiático.
“Estamos a desenvolver melhores formas de tratamento destes problemas mais cedo para reduzir a carga da doença e a tentar rastrear melhor aqueles que correm maior risco de desenvolver cancro do fígado, oferecendo melhores estratégias de rastreio e mais personalizadas. O reconhecimento precoce e o tratamento imediato são necessários para melhorar os resultados.”