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Como falar com uma criança sobre o cancro num ente querido: a conversa e os desafios

como contar sobre cancro a uma criança

Qual a melhor forma de falar com uma criança quando há um caso de cancro na família, sem a assustar ou preocupar?Kathleen Ingman, Diretora do Serviço de Saúde Comportamental, Neuropsicologia e Educação HOPE no Hospital Infantil de Los Angeles, ajuda a dar resposta a esta questão.

“Enquanto adultos, quando ouvimos a palavra ‘cancro’, é um termo carregado. É realmente assustador”, explica a especialista, que revela ainda que as crianças, sobretudo as mais novas, não têm necessariamente ideias ou emoções preexistentes associadas à palavra.

“Temos a oportunidade de contar às crianças coisas muito precisas e factuais sobre o cancro”, acrescenta. “Se tivermos de falar sobre os aspetos mais assustadores, o que dizemos pode ajudá-las a compreender de uma forma que tem um impacto emocional muito diferente.”

O que fazer e como fazê-lo

Planear com antecedência
Deve planear-se o que se vai dizer a uma criança, usando palavras precisas, como “cancro” – incluindo o tipo específico de cancro -, “quimioterapia” e “radiação”, para o ajudar a desenvolver um vocabulário sobre o assunto e garantir que não fica confuso ao ouvir estas palavras mais tarde.

Deve ainda anotar-se aquilo que se planeia dizer e praticar, se necessário; utilizar um tom de voz calmo e tranquilizador quando falar com eles, podendo ser útil ter outra pessoa, outro membro da família ou um membro da equipa de tratamento.

Ser sincero
Pode haver sensação de que se está a proteger a criança ao não lhe contar sobre a doença de um ente querido, mas Ingman recomenda que os pais evitem mentir ou esconder o diagnóstico, já que as crianças são muito perspicazes e provavelmente sentirão que algo está errado de qualquer forma. Ocultar informação pode fazer com que desenvolvam uma compreensão imprecisa do que está a acontecer ou interiorizem medos ainda maiores.

“Precisamos de dar às crianças a oportunidade de participar na conversa”, diz Ingman. “Inclua-as na experiência e em tudo o que o resto da família estiver a passar. Desta forma, todos podem obter o apoio de que necessitam.”

Começar de forma simples e deixa a criança guiar a conversa
“Normalmente, se começar com uma explicação mais simples e o seu filho fizer perguntas, significa que está pronto para ouvir mais informações”, explica a médica, incentivando os pais a deixarem a criança ser o guia.

“Se ele ouvir a informação e não estiver curioso ou não quiser voltar ao que estava a fazer, isso pode ser tudo o que conseguirá suportar naquele momento.”

Se ele estiver curioso, é provável que oiça perguntas sobre como as rotinas da criança podem mudar. “As crianças geralmente querem saber coisas muito concretas e práticas no início”, explica Ingman. “Podem fazer perguntas sobre quem as vai deixar na escola ou levá-las para a ginástica.”

Esta conversa provavelmente não será um evento único: a criança pode abordá-lo mais tarde com perguntas. Tal como os adultos, precisa de tempo para processar o que acabou de aprender. Certifique-se de que observa os sinais ou perguntas que indiquem que ele quer falar mais sobre o assunto.

Não esperar ter todas as respostas
É perfeitamente normal não saber as respostas a algumas perguntas da criança. Se alguma pergunta o deixar perplexo, tente responder algo como: “Essa é uma boa pergunta, mas não sei a resposta. Vou tentar descobrir mais sobre isso e depois conto-te.”

Normalizar as emoções fortes 
Devem partilhar-se os sentimentos com a criança e incentivá-la a partilhar os dela.

Ingman incentiva os pais a lembrarem os filhos que não há problema em estar nervoso, assustado ou triste — mas que não é função deles preocuparem-se com o seu ente querido e dizer algo como: “Não há problema em estar nervoso. Eu também estou. Mas há muitos adultos que estão a cuidar de ti e da pessoa com cancro. Não tens de te preocupar com isso, porque temos outras pessoas no comando.”

“As crianças tentam muitas vezes proteger os adultos importantes nas suas vidas, por isso podem não partilhar todas as suas preocupações e sentimentos consigo, porque não querem sobrecarregá-lo”, afirma Ingman, que sugere que se ligue a um adulto alternativo (um amigo próximo ou familiar) com quem se sintam confortáveis ​​em contactar.

Ajudar as crianças a sentirem controlo
É importante que se ofereçam opções concretas para demonstrar afeto pelo ente querido, para ajudar a criança a sentir controlo sobre a situação. Isto pode ser algo simples como fazer um cartão, ligar à pessoa, levar flores ou preparar uma refeição especial.

Definir expectativas sobre quando incluir ou não incluir a criança nas conversas sobre cuidados
Pode haver conversas mais amplas sobre os cuidados a ter com um ente querido que não são apropriadas para uma criança pequena, mas ainda assim é possível fazê-la sentir-se incluída, garantindo que se está a guardar segredos: “Vamos falar sobre algumas coisas chatas de adultos agora, sobre médicos e medicamentos. Contaremos mais tarde, se estiver curioso.”

Planear a conversa com base no nível de desenvolvimento da criança
As crianças de todas as idades devem saber:

  • A parte do corpo onde se encontra o cancro, o nome do cancro
  • Como as suas próprias vidas podem ser afetadas
  • Como será tratado e o nome e descrição do tratamento (por exemplo, “quimio ou quimioterapia é um nome especial para um medicamento muito forte”)
  • O que mudou na pessoa (por exemplo, queda de cabelo, cicatrizes, mobilidade, energia)
  • O que ela consegue ver durante uma visita ao hospital (por exemplo, tubos, máquinas)
  • Que ela pode desempenhar um papel ativo nos cuidados e tratamento do seu ente querido

Dos 3 aos 7 anos:

  • Ser objetivo, mas utilizar explicações simplificadas.
  • Não evitar a palavra “cancro” ou o nome da condição.
  • Tranquilizar as crianças dizendo que não são responsáveis ​​pelo cancro, mesmo que não perguntem.

Dos 7 aos 12 anos:

  • As crianças desta idade são capazes de compreender uma explicação mais detalhada sobre o cancro e o seu tratamento, pelo que se deve incentivá-las a falar caso tenham dúvidas.
  • Podem ouvir mensagens sobre o cancro de outras fontes (escola, amigos). Deve assumir-se que já ouviram dizer que o cancro pode causar a morte e tranquilizá-las, mesmo que não mencionem o assunto.
  • Assegurar-lhes que uma equipa de médicos está a trabalhar para ajudar o seu ente querido.

Adolescentes:

  • Os adolescentes conseguem compreender uma explicação mais complexa sobre o cancro e podem ter muitas questões, podem estar preocupados com o futuro e com a possibilidade de morte, podem procurar informações por conta própria na internet ou nas redes sociais, e essas informações podem não ser precisas.
  • Deve procurar apoio para si e para o jovem.
Crédito imagem: iStock

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