
A estimulação do cerebelo durante o envelhecimento tem impacto na melhoria da memória episódica (a capacidade de recordar histórias e ações do quotidiano) dos idosos, revela um estudo liderado por Jorge Almeida, docente e investigador da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra.
A conclusão desta investigação demonstra o papel desta zona do cérebro para atrasar o declínio cognitivo associado ao envelhecimento, reforçando a importância de intervenções não farmacológicas nesta prevenção.
Com a esperança média de vida a aumentar, a Organização das Nações Unidas estima que, em 2050, uma em cada seis pessoas no mundo terá mais de 65 anos. Esta previsão demográfica vai colocar desafios enormes à sociedade, dado que o envelhecimento está fortemente ligado ao declínio cognitivo, a doenças neurodegenerativas e a fragilidades diversas.
Salientando que a memória episódica será, provavelmente, a maior vítima do declínio cognitivo associado ao envelhecimento, os autores do estudo revelam esperança nos resultados face ao contexto demográfico atual e futuro, e reforçam a importância de intervenções não farmacológicas para a prevenção e diminuição do declínio cognitivo em idosos.
O estudo, publicado na revista GeroScience (uma das revistas mais importantes na área da gerontologia), contou com a participação de idosos saudáveis, com mais de 60 anos, que foram sujeitos a um treino cognitivo e a uma técnica de estimulação neuronal indolor (a neuroestimulação transcraniana por corrente direta).
Como explica Jorge Almeida, a investigação mostrou “uma melhoria na capacidade de idosos saudáveis se recordarem de listas de palavras, após somente doze sessões consecutivas de estimulação cognitiva e neuronal”.
Sobre as melhorias apresentadas, “os idosos estimulados no cerebelo foram capazes de se recordar de mais quatro palavras, em média, num total de 16, quando comparados com os outros grupos de controlo”, sublinha o também diretor do Proaction Lab e investigador do Centro de Investigação em Neuropsicologia e Intervenção Cognitivo-Comportamental.
O aumento na capacidade de memória foi acompanhado de modificações ao nível neuronal na ligação entre as áreas responsáveis pela memória – ou seja, o efeito da estimulação do cerebelo foi também visível nas estruturas neuronais que suportam a memória episódica, fortificando as suas conexões. Estas melhorias foram registadas imediatamente após o programa de intervenção, que teve a duração de 12 dias, e continuaram estáveis no controlo realizado quatro meses depois.
Jorge Almeida destaca ainda que “estes dados demonstram a nossa capacidade de atuar, de forma simples e não farmacológica, numa das maiores queixas relacionadas com o declínio cognitivo na terceira idade – a nossa capacidade de nos recordarmos de coisas do nosso dia-a-dia”.
O estudo, que envolveu uma equipa multidisciplinar e multinacional composta por psicólogos, médicos e engenheiros de várias universidades (nomeadamente Coimbra, Harvard e São Paulo), aponta também para um papel renovado do cerebelo ao nível dos processos cognitivos e no modo como a mente funciona, que vai para além da típica ligação aos aspetos de coordenação de movimento.