O número total de mortes por doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) tem aumentado em muitos países nos últimos 20 anos, revela uma nova avaliação internacional dos dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), que mostra ainda que a taxa de mortalidade tem vindo a cair.
O estudo, publicado no European Respiratory Journal, inclui dados de países não avaliados anteriormente e sugere que medidas para reduzir a exposição a fatores de risco para DPOC, como políticas de controlo do tabaco e declínio da pobreza, estão a surtir um efeito positivo na redução das taxas gerais de mortalidade pela doença.
A DPOC é uma doença que resulta de uma inflamação nos pulmões, estreitamento das vias aéreas e tecido pulmonar danificado, dificultando a respiração. É geralmente causada por fatores que desencadeiam inflamação pulmonar, como tabagismo e exposição à poluição do ar.
Atualmente, não há cura para a DPOC, mas a doença pode ser gerida com medicamentos e programas de exercícios supervisionados.
Joannie Lortet-Tieulent, investigadora da Agência Internacional de Investigação sobre Cancro da OMS, principal autora do estudo, refere que, “segundo os dados da OMS, em 2015 havia 175 milhões de pessoas a viver com DPOC”.
O que os especialistas decidiram agora fazer foi confirmar estes dados, através da contagem de mortes por DPOC registadas entre 1995 e 2017 no banco de dados de mortalidade da OMS, avaliadas por idade, sexo e ano. No total, foram analisadas cerca de 3,36 milhões de mortes por DPOC.
Taxa de mortalidade por DPOC caiu 12%
Recolhidos em 24 países, seis da América Latina e Caraíbas, dois da América do Norte, Ásia e Oceânia e 12 da Europa, os dados foram padronizados usando uma população de referência para garantir a precisão das comparações entre populações ao longo do tempo.
E foi desta forma que conseguiram traçar as taxas de mortalidade por DPOC ao longo do tempo para homens e mulheres em cada país. A análise focou-se apenas em pessoas de 50 a 84 anos.
Começando em 2000 e terminando em 2015, os dados mostraram que a taxa de mortalidade combinada para todos os países incluídos na análise caiu 12%.
Passou de 68 mortes por 100.000 pessoas por ano no início do estudo, para 60 mortes por 100.000 pessoas por ano no final do mesmo.
No entanto, o número de mortes totais aumentou 12%: no início do período em estudo estimava-se 180.950 mortes por DPOC para todos os países incluídos na análise, total que aumentou para 203.090 no final do mesmo.
“Acreditamos que o número de mortes está a aumentar porque, em todos os países, a expectativa de vida está a crescer, assim como as populações”, refere Lortet-Tieulent.
“Mesmo que a taxa de mortalidade por DPOC possa cair com o tempo, o declínio é pequeno demais para compensar o facto de que, a cada ano, haver mais pessoas a morrer devido à DPOC como resultado do envelhecimento da população.”
Segundo a especialista, “os dados sugerem que a proporção de pessoas com DPOC que estão a morrer precocemente devido à doença está a cair globalmente e isso é muito encorajador. Isso significa que as pessoas podem estar menos expostas aos fatores de risco da DPOC e que a doença está a ser gerida com mais eficácia”.
Diferenças entre homens e mulheres
Os investigadores referem que a redução da exposição a fatores de risco, como o fumo do tabaco, a poluição do ar em casa e no trabalho, bem como a diminuição dos níveis de pobreza e o melhor acesso aos cuidados de saúde na maioria dos países podem ter um papel na queda nas taxas de mortalidade por DPOC.
Quando foram analisados os dados por sexo, estes mostraram que, a partir de 2016, as taxas de mortalidade pela doença foram mais elevadas entre os homens na Hungria e no Quirguistão e entre as mulheres nos EUA e na Hungria.
As taxas de mortalidade foram, por sua vez, mais baixas entre os homens na Itália, Costa Rica e Israel e entre as mulheres na Letónia, Espanha e Lituânia.
A importância de reforçar a consciencialização
Apesar da tendência geral revelar que as taxas de mortalidade diminuíram, a análise mostrou também que, entre as mulheres com DPOC, as taxas de mortalidade permaneceram no mesmo nível na América do Norte e até aumentaram em vários países europeus entre 2000 e 2015.
“O nosso estudo não explica porque é que as taxas de mortalidade por DPOC entre as mulheres aumentaram em alguns países, mas acreditamos que essa tendência possa estar associada ao aumento do consumo do tabaco entre as mulheres, pois o tabagismo é um importante fator de risco para a doença”, afirma a especialista.
“Nos países em que as mulheres fumam tanto e há tanto tempo como os homens, como EUA, Nova Zelândia e Reino Unido, a taxa de mortalidade feminina por DPOC tornou-se muito semelhante à dos homens ao longo do tempo. Aumentar a consciencialização sobre a DPOC em mulheres poderia permitir um diagnóstico mais precoce, melhorando a gestão da doença e diminuindo o risco de morte.”
Segundo Thierry Troosters, especialista dos Hospitais Universitários de Lovaina, na Bélgica e presidente da Sociedade Respiratória Europeia, “a DPOC é um grande ónus para a saúde de indivíduos, sociedades e sistemas de saúde em todo o mundo”.
De acordo com o especialista, “este estudo fornece dados para mostrar que, com o tempo, a taxa de mortes precoces causadas pela DPOC está a diminuir em muitos países”, o que sugere que “o tratamento e as medidas para reduzir a exposição aos fatores de risco da DPOC são eficazes, pois os doentes vivem mais tempo com uma melhor gestão da doença. Devemos continuar a pressionar para uma implementação mais forte das políticas de controlo do tabaco e de ar limpo em todo o mundo”.
Thierry Troosters acrescenta ainda que é preciso “continuar a aumentar a aceitação da gestão abrangente da doença, inclusive através de farmacoterapia e reabilitação pulmonar, pois estes tratamentos efetivamente reduzem o ónus da DPOC. O diagnóstico precoce é outro ponto de atenção, para que os doentes sejam identificados o mais cedo possível e a sua doença possa ser tratada mais rapidamente”.
Isabel Saraiva vive com DPOC há 13 anos. A presidente da Fundação Europeia do Pulmão, como pessoa que vive com DPOC, está satisfeita por ver que, “em todo o mundo, a taxa de mortalidade por DPOC está a cair, mas não devemos ter isso como garantido. Mais mulheres com DPOC estão agora a morrer em alguns países europeus, e isso mostra que a questão de género é importante e enfatiza a necessidade de continuar a consciencializar sobre formas de prevenir a DPOC, como parar de fumar e respirar ar puro”.
“É provável que mais pessoas vivam por muito mais tempo com DPOC à medida que envelhecemos, e isso será um desafio para os doentes e para os sistemas de saúde. Precisamos de continuar a procurar tratamentos e formas mais eficazes de gerir a doença. E devemos também reduzir o estigma à volta desta e aumentar a consciencialização sobre outros fatores de risco além do fumo”, acrescenta.