A endometriose, uma doença que afeta até 10% das mulheres, é enigmática desde que foi descrita pela primeira vez. Agora, uma nova teoria sugere que uma hormona anteriormente esquecida, a testosterona, pode ter um papel essencial no desenvolvimento deste problema, o que pode vir a ter impacto direto no diagnóstico e tratamento da doença, sinalizando esperança para mulheres com endometriose em todo o mundo.
A doença é causada pelo crescimento do tecido endometrial fora do útero, normalmente na região pélvica, onde contribui para dor, inflamação e infertilidade. Mas o porquê de afetar algumas mulheres e outras não é ainda um mistério.
O novo estudo, desenvolvido por investigadores da Simon Fraser University, no Canadá, é baseado em descobertas recentes de que as mulheres com endometriose desenvolveram-se, ainda enquanto fetos no útero da mãe, em condições de níveis de testosterona relativamente baixos, em comparação com as mulheres sem endometriose.
De acordo com a teoria, esta baixa testosterona “programa” o desenvolvimento do sistema reprodutivo das mulheres para exibir um conjunto único de características relacionadas com a endometriose, incluindo menarca precoce, ciclos menstruais curtos, elevada sensibilidade à dor, inflamação e níveis alterados das hormonas que controlam a ovulação e o ciclo menstrual.
Os especialistas descobriram que a sua teoria era apoiada por um conjunto vasto de dados na literatura, desde a área da genética e desenvolvimento até à endocrinologia, morfologia, história de vida e biologia evolutiva, fornecendo assim a primeira explicação abrangente para as características associadas à endometriose.
A teoria pode explicar quase todos os sintomas da endometriose como efeitos a jusante da reduzida testosterona no início da vida. Os resultados são apresentados em dois artigos recentes publicados nas revistas Evolution, Medicine and Public Health e Evolutionary Applications.
Dicas para avanços na endometriose e não só
“Baixos níveis de testosterona no início do desenvolvimento estão relacionados com a endometriose, e os seus efeitos podem explicar a maioria dos sintomas”, afirma Bernard Crespi, líder da pesquisa e coautor do trabalho. “Além do mais, a nova teoria tem implicações diretas para o diagnóstico e tratamento da endometriose.”
Crespi observa que a testosterona tem sido aparentemente esquecida nos estudos sobre endometriose porque é geralmente considerada uma hormona “masculina”, embora seja conhecida por ter efeitos importantes também nas mulheres.
“É muito comum que os investigadores se concentrem no estrogénio como hormona feminina e na testosterona como hormona masculina, mas, na realidade, estas duas hormonas são extremamente importantes em todos os humanos”, explica Ben Trumble, professor na Arizona State University.
“Este trabalho estabelece a endometriose como um distúrbio endócrino do desenvolvimento, com raízes no início da vida”, refere Crespi. “Também esclarece a relação da endometriose com a síndrome do ovário poliquístico, um distúrbio impulsionado por níveis muito altos, em vez de muito baixos, de testosterona pré-natal. Mostramos que a síndrome do ovário poliquístico é essencialmente oposta à endometriose nas suas causas, relações e sintomas principais. Como tal, este trabalho deve ajudar a transformar a nossa compreensão de ambos os transtornos.”