
Os sentimentos de vergonha estão associados a uma redução da qualidade de vida, revela o primeiro estudo a medir a vergonha como um fator que influencia a associação entre os distúrbios intestinais crónicos e a saúde mental.
“Os resultados realçam a importância da compaixão nos cuidados de saúde para estes doentes e as suas dolorosas experiências de vergonha”, afirma Inês Trindade, investigadora de psicologia na Universidade de Örebro, na Suécia.
Inês Trindade examinou a forma como o sentimento de vergonha afeta as pessoas com Distúrbios da Interação Intestino-Cérebro, um grupo de distúrbios intestinais crónicos ou recorrentes em que os exames clínicos não conseguem identificar as causas subjacentes, sendo um dos exemplos mais conhecidos a síndrome do intestino irritável.
O estudo baseia-se na compreensão de que a qualidade de vida e o bem-estar psicológico interagem com os sintomas intestinais, pelo que sintomas mais graves podem levar a um maior sofrimento psicológico. O mesmo se aplica ao inverso: o agravamento da saúde mental pode exacerbar os sintomas físicos.
“Sabemos também que os distúrbios intestinais são muitas vezes percecionados como vergonhosos devido a atitudes sociais de julgamento. Isto cria um estigma que pode levar os indivíduos a sentir vergonha”, afirma Inês Trindade.
Estes tipos de distúrbios intestinais (podem ter diversas consequências. Incluem a necessidade de ir à casa de banho com frequência, diarreia ou obstipação, dor abdominal e inchaço. Isso faz com que as pessoas evitem certos alimentos e situações sociais para escapar ao desconforto ou por medo de exporem os sintomas. Estes problemas físicos estão associados a condições psicológicas, como a depressão e a ansiedade, e à redução da qualidade de vida geral.
O estudo mostra que diferentes níveis de vergonha percebida entre os participantes impactam a qualidade de vida, pelo que o mesmo nível de sintomas físicos resultou em diferentes níveis de qualidade de vida, dependendo do nível de vergonha sentido pela pessoa. Os indivíduos com níveis mais elevados de vergonha experienciaram uma qualidade de vida significativamente mais baixa do que os indivíduos com níveis mais baixos de vergonha, mesmo com a mesma gravidade dos sintomas.
“Demonstrámos que a vergonha é um importante fator explicativo — um mecanismo que liga estes distúrbios intestinais à fraca saúde mental e à redução da qualidade de vida. Mas também existe uma ligação direta entre os sintomas gastrointestinais e a saúde mental que não está associada à vergonha”, afirma Inês Trindade.
A especialista realça que é normal sentir vergonha, pois somos seres sociais. No entanto, este sentimento também pode ter um efeito corrosivo, levando a uma série de estados psicológicos negativos. Um exemplo é a tendência para evitar o contacto com outras pessoas.
Inês Trindade vê nos resultados do estudo sobre distúrbios intestinais potenciais implicações para a saúde, embora as interações doente-profissional não tenham sido o foco deste projeto de investigação. Em vez disso, baseia-se em resultados de outros estudos para interpretar a importância das suas descobertas: “A empatia e a compaixão são remédios essenciais para os sentimentos de vergonha. Reconhecer a experiência do doente e demonstrar interesse genuíno são formas de oferecer apoio e ajudar. Mesmo que seja apenas uma consulta de dez minutos, pode fazer toda a diferença. A empatia na saúde não é um luxo — faz parte dos cuidados baseados na evidência”, afirma.