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Saúde baseada em valor: uma abordagem para melhorar resultados e reduzir custos

Saúde baseada em valor

Vanessa Jacinto, Head of Market Access & Public Affairs da Boehringer Ingelheim, reflete, neste artigo de opinião, sobre a importância de uma abordagem de saúde baseada em valor e sobre como esta pode ser determinante para a sustentabilidade dos sistemas de saúde e para a melhoria dos resultados em saúde dos doentes.

“Seria de esperar que a discussão sobre o tema da saúde baseada em valor, tema há muito debatido, tivesse como ponto de partida a definição de ‘valor’. Contudo, trata-se de um conceito que pode assumir diferentes significados. Pode ser usado para definir os princípios que orientam a prestação de cuidados de saúde, pode ser um conceito mais económico e pode ainda traduzir aquilo que muitas vezes se procura em cuidados de saúde: a eficiência.

Os teóricos da área, como Michael Porter e Elizabeth Teisberg, propõem uma fórmula apresentada no livro Redefining Health Care, segundo a qual o valor corresponde à divisão entre os resultados que realmente importam para os doentes — como a cura de uma doença ou a melhoria da qualidade de vida — e o custo necessário para os alcançar. Se pensarmos o valor desta forma, concluímos que, para se alcançar um sistema de saúde baseado em valor, é imperativo colocar o doente e os seus resultados em saúde, no centro dos cuidados. O que, dizem muitos especialistas, é essencial para garantir a sustentabilidade dos sistemas de saúde e, ao mesmo tempo, impulsionar a melhoria do desempenho na prestação desses cuidados.

Quando os resultados para o doente se tornam o foco central, a melhoria surge como consequência natural: melhores resultados em saúde traduzem-se em menos admissões hospitalares, melhor controlo de doenças crónicas e maior satisfação dos doentes. E uma vez que esta abordagem tem também como foco a tomada de decisão partilhada, em que o doente se torna parceiro da equipa de saúde na gestão dos seus problemas, esta forma de encarar os cuidados conduz ainda a um maior envolvimento, a uma melhor adesão aos planos de tratamento e a um atendimento mais personalizado.

A questão da eficiência, frequentemente utilizada como argumento em decisões na área da saúde, também entra nesta equação. Ao evitar procedimentos desnecessários e ao privilegiar tratamentos eficazes, esta abordagem permite reduzir o desperdício — que, segundo vários estudos, é elevado. De facto, em 2010, o Relatório Mundial da Saúde, da Organização Mundial de Saúde, sugeria que entre 20% e 40% dos recursos de saúde poderiam estar a ser desperdiçados, por diferentes vias, mas todas elas associadas à ineficiência.

Em 2017, um documento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) (1) revelava que, nos países de rendimento elevado, os gastos supérfluos variaram entre 10% a 20% do total das despesas em saúde. Nele pode ler-se, a título de exemplo, que 31,3% das visitas às urgências em Portugal eram identificadas, na altura, como “inadequadas”, o que resultava no gasto de recursos já por si escassos, assim como numa perda de tempo por parte dos doentes.

A confirmação de que um quinto das despesas de saúde pouco ou nada contribui para bons resultados devia ser motivo suficiente para uma reflexão urgente. Mas há outros ganhos já confirmados. Um relatório da EIT Health e do Boston Consulting Group, concluiu que os sistemas de cuidados baseados no valor melhoram os resultados para os doentes – sobretudo na gestão de doenças crónicas – melhoram a eficiência de custos e promovem maior satisfação através da tomada de decisão partilhada.

É certo que existem desafios na adoção de modelos baseados no valor. Mas o que mais falta é uma mudança cultural e de mentalidade, que permita a transição dos modelos tradicionais para aqueles que têm o potencial de transformar verdadeiramente os sistemas de saúde. A resistência à mudança, a complexidade na medição de resultados e a necessidade de reorganização de processos são obstáculos reais.

No entanto, face às evidências de desperdício e aos ganhos já documentados em sistemas que adotaram esta abordagem, a inação torna-se cada vez mais difícil de justificar. Ainda que a saúde baseada em valor não seja uma solução mágica para todos os problemas, está comprovado que representa uma mudança de paradigma fundamental: da quantidade para a qualidade, do volume de atividade para o impacto real, da fragmentação dos cuidados para a sua integração em resposta às necessidades do doente.

Neste Dia Mundial da Poupança, devemos refletir sobre como a saúde baseada em valor pode ser uma das formas mais eficazes de poupar recursos sem comprometer a qualidade dos cuidados. Está nas mãos de todos os que trabalham na área da saúde transformar o sistema — com decisões mais informadas, centradas no doente e orientadas para resultados. Comecemos hoje.”

 

Crédito imagem: DR

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