
A Sociedade Portuguesa do Acidente Vascular Cerebral (SPAVC) divulga os resultados do estudo de caracterização das Unidades de AVC em Portugal, um trabalho que nasceu da necessidade, segundo explica Miguel Rodrigues e José Mário Roriz, especialistas em neurologia e coordenadores do mesmo, “identificar, no nosso país, as estruturas existentes para tratamento agudo e subagudo do AVC, bem como caracterizá-las num formato mais sistemático, detalhado e objetivo”. Um estudo que conclui que há uma grande disparidade de tratamento do AVC a nível nacional.
De acordo com os especialistas, “o aparecimento das Unidades de AVC e a implementação da Via Verde do AVC tiveram um papel determinante na diminuição da mortalidade por AVC na última década e na melhoria dos cuidados no AVC agudo em Portugal”. No entanto, “o funcionamento da Via Verde do AVC e a estrutura e organização das Unidades de AVC é díspar a nível nacional”, isto é, os vários hospitais adotam modelos de funcionamento e recursos humanos variados no tratamento do AVC.
Adicionalmente, as Unidades de AVC “nunca foram formalmente reconhecidas nem integradas numa rede nacional”, colocando limitações à sua organização e funcionamento.
Em traços gerais, o estudo demonstrou que as redes de referenciação existentes para terapêutica aguda de revascularização não seguem um plano nacional concertado e devidamente organizado, “para a criação de uma rede geograficamente equitativa”. Da mesma forma, “há uma distribuição claramente desigual das Unidades de AVC pelo território português”.
“Os dados continuam a revelar que a maioria das Unidades de AVC apresenta constrangimentos importantes na infraestrutura e capital humano – algumas em consequência de reestruturações decorrentes da pandemia COVID-19”, lê-se nas conclusões do documento.
É referido que três das 35 Unidades de AVC identificadas em 2021 “reconhecem não ter equipa própria de enfermeiros, cinco em 35 admitem não ter fisioterapeutas dedicados e três em 35 referem não ter terapeutas da fala na equipa da Unidade de AVC – sendo que uma em 35 não realiza ainda pesquisas protocoladas sistemáticas de disfagia”.
O reforço de médicos, enfermeiros, terapeutas e assistentes operacionais foi uma das principais e mais preocupantes necessidades listadas como comuns ao tratamento do AVC nas diferentes Unidades de analisadas.
O estudo dá ainda conta da ausência de médico com competência específica em AVC em presença física 24 horas por dia, sete dias por semana em 16 das 35 unidades, assim como uma indisponibilidade de Neurologista 24/7 na maioria (21 em 35).
Recomendações para melhorar o tratamento do AVC
Estes dados, aos quais se junta a certeza de um envelhecimento da população, “sendo a idade um dos mais fortes fatores de risco para o AVC”, o que torna este aumento preditor de uma subida na incidência global do AVC, leva os autores do estudo a apresentarem algumas recomendações para melhor o tratamento do AVC.
Apesar de uma evolução positiva na disponibilidade de hospitais para o AVC agudo, “há lacunas identificadas ao nível da infraestrutura, organização e recursos humanos que são transversais a quase todas as unidades”. Por isso, os especialistas defendem a proposta, ao Ministério da Saúde, da criação de “uma Rede Nacional de Unidades de AVC, uma vez que as atuais Redes de Referenciação Hospitalares não descrevem nem representam as Unidades de AVC e a Via Verde de AVC!.
A proposta ainda da definição de uma política para o tratamento do AVC agudo em cada hospital, “com as competências que pode assumir no seu perfil assistencial”; “que, com a criação desta Rede, se dotem os hospitais de recursos financeiros e de capital humano específicos, adequado à função e tarefas que desempenham a nível regional”.
E ainda que “o que suporta o tratamento do AVC agudo e os cuidados pós-agudos tenha uma estrutura definida, que deve ser preservada, mesmo em períodos de contingência por fenómenos epidemiológicos ou sazonais, para que a acessibilidade aos cuidados seja uniforme ao longo do tempo”.