Um grupo de cientistas criou uma rede cirúrgica capaz de se adaptar perante alterações de temperatura e humidade, para minimizar os riscos de inflamação e dor crónica na cicatrização de hérnias abdominais e inguinais.
Todos os anos são realizadas mais de 20 milhões de cirurgias de reparação de hérnia em todo o mundo, a maioria abdominais e inguinais. A técnica mais eficaz para reparar tecidos danificados, seja com cirurgia aberta ou laparoscópica, é a colocação de uma tela cirúrgica.
O Grupo de Inovação em Materiais e Engenharia Molecular da Universidade Politécnica da Catalunha, no âmbito do projeto ‘4D-POLYSENSE’ desenvolveu uma nova geração de redes cirúrgicas não absorvíveis, com uma camada de hidrogel biocompatível, que se destina a ajudar a reduzir os problemas relacionados com a implantação de materiais poliméricos rígidos em áreas em contacto com os tecidos delicados da parede abdominal.
A chave está no material inteligente agora usado: um gel polimérico termossensível, capaz de responder às mudanças de temperatura e de se adaptar aos tecidos moles, modulando a sua forma.
Melhores resultados no pós-operatório das hérnias
O hidrogel é um tipo de material polimérico capaz de reter uma grande quantidade de líquido sem se dissolver. Os hidrogéis termossensíveis têm a capacidade de aumentar de volume, tendo em conta as mudanças de temperatura.
Ou seja, em contacto com a temperatura corporal, o material é capaz de se expandir ou contrair para se adaptar ao local da implantação. Esse efeito, chamado ‘resposta 4D’ ou efeito dinâmico, é alcançado pelo revestimento de hidrogel nos fios de polipropileno da rede, o que lhe dá a capacidade de responder a mudanças de temperatura e humidade.
Elaine Armelin, investigadora principal, explica que foi, “pela primeira vez, obtida uma rede cirúrgica não absorvível, capaz de oferecer propriedades de adaptabilidade de acordo com a temperatura e a humidade do ambiente local onde será implantada”.
É a primeira rede cirúrgica capaz de responder a mudanças de temperatura de 25 a 40 graus Celsius.
A investigação está atualmente em fase laboratorial (in vitro). Num artigo publicado recentemente na revista científica Advanced Functional Materials, os investigadores explicam como a rede de polipropileno estática pode ser convertida num sistema dinâmico e como as suas propriedades estruturais são alteradas.
“O fabrico de redes cirúrgicas convencionais é baseado numa tecnologia têxtil amplamente conhecida que transforma fibras de polímero (1D) numa estrutura tecida bidimensional (2D). Graças ao hidrogel, a estrutura 2D torna-se num material inteligente, capaz de responder a certos estímulos, como mudanças locais de temperatura, dando lugar a uma estrutura ativa e dinâmica, com capacidade de movimento, que permite a sua adaptação ao ambiente, o que é conhecido como tecnologia 4D”, refere a especialista.
Essa capacidade que o material tem de se modular e adaptar será muito útil no momento da cirurgia, pois facilitará a manipulação pela equipa médica durante o implante, mas também no pós-operatório, permitindo uma melhor adaptação ao tecido circundante e minimizando o risco de dor.
“O efeito adaptativo da rede é criado para ajudar a reduzir os riscos de processos inflamatórios que possam surgir após a cirurgia, o que não apenas melhora a qualidade de vida das pessoas operadas, mas também se traduz em ganhos económica para o sistema de saúde, minimizando o risco de reoperação das hérnias ou uso de medicamentos para a dor crónica“, conclui.