Assegurar a equidade de acesso ao ecocardiograma e a comparticipação dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica são apenas duas das 54 recomendações apresentadas por peritos nacionais, que visam melhorar a gestão e os cuidados prestados ao doente com insuficiência cardíaca.
Um conjunto de medidas identificadas na sequência da divulgação dos resultados do estudo PORTHOS (Portuguese Heart Failure Prevalence Observational Study), uma iniciativa da Sociedade Portuguesa de Cardiologia e da AstraZeneca, em parceria com a NOVA Medical School.
“Os dados obtidos no estudo demonstram que existe uma necessidade premente de abordar, de forma inovadora e transversal, a problemática da insuficiência cardíaca”, confirma Rui Baptista, coinvestigador principal do estudo.
“Neste contexto, a utilização dos dados do PORTHOS só atingirá a sua implementação adequada quando estes chegarem aos decisores e profissionais de saúde. Assim sendo, considerámos que a melhor forma de sumarizar e sistematizar os resultados obtidos no PORTHOS seria através da elaboração de um conjunto de recomendações fundamentadas nos dados recolhidos.”
Dar prioridade à insuficiência cardíaca
Tendo em vista uma melhor gestão da síndrome, um painel de peritos de insuficiência cardíaca, composto por especialistas de Cardiologia, Medicina Interna, Medicina Geral e Familiar e Epidemiologia e Investigação Clínica, emitiu, no total, 54 recomendações, com foco no aumento do conhecimento da doença, na melhoria do diagnóstico e da referenciação e seguimento atempado dos doentes.
Recomendações que o investigador gostaria de ver implementadas, embora reconheça “que tal nem sempre é inteiramente exequível. Estou certo, porém, que podemos sensibilizar os decisores para a importância da problemática da insuficiência cardíaca em Portugal, demonstrando simultaneamente a nossa total disponibilidade para colaborar na construção de melhores cuidados para estes doentes”.
Priorizar a IC no atual Plano de Emergência e Transformação na Saúde do Ministério da Saúde, no Programa Nacional para as Doenças Cérebro-Cardiovasculares e no Plano Nacional de Saúde 2030 da Direção-Geral da Saúde é um dos grandes desejos de quem trata este problema, que aponta a necessidade de medidas também ao nível da referenciação e seguimento atempado, com a implementação de um processo único eletrónico integrado e partilhado entre os diferentes níveis de cuidados de saúde, bem como o desenvolvimento do acesso à teleconsulta e ao processo único eletrónico, com equipas clínicas com diferentes valências.
A notícia recente da comparticipação do NT-proBNP, um dos testes para detetar e avaliar a insuficiência cardíaca é, segundo Rui Baptista, “uma extraordinária conquista”.
Mas, acrescenta o especialista, “a disponibilidade desta nova ferramenta diagnóstica irá certamente requerer formação específica, tendo em consideração que, ao contrário de outros biomarcadores, o NT-proBNP apresenta uma sensibilidade muito elevada, mas uma especificidade relativamente baixa1. Assim, vai ser preciso desenvolver ações de formação específica, focadas na interpretação quantitativa e qualitativa do marcador, bem como a sua integração na probabilidade pré-teste do doente e nos resultados do ecocardiograma. Será um desafio, mas estou completamente convencido que será uma mudança de paradigma no diagnóstico de insuficiência cardíaca em Portugal”.
No que diz respeito à reorganização do SNS em Unidades Locais de Saúde (ULS), Rui Baptista considera que “pode abrir grandes perspetivas para a integração de cuidados, não só no desenvolvimento de processos assistenciais integrados para a insuficiência cardíaca, como também na partilha de informações e referenciação bidirecional de doentes”.
Recorde-se que os dados do estudo PORTHOS revelaram que muitos dos doentes com IC desconheciam o diagnóstico: mais de 90% não tinham conhecimento que sofriam de insuficiência cardíaca, sobretudo as mulheres, as pessoas com mais de 70 e os doentes com a forma de insuficiência cardíaca com fração de ejeção preservada.