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Especialistas exigem ação urgente contra a endometriose em todo o mundo

endometriose

Duas revisões publicadas na revista The Lancet Obstetrics, Gynaecology & Women’s Health revelam desigualdades globais gritantes na forma como a endometriose é reconhecida, tratada e priorizada nos sistemas nacionais de saúde.

A endometriose é uma doença inflamatória crónica que pode causar dor pélvica intensa e infertilidade, estimando-se que afete uma em cada dez mulheres e raparigas em todo o mundo. Mas o que nova investigação mostra é que, de entre os 194 estados-membros da Organização Mundial de Saúde (OMS), quase metade não tem políticas nacionais ou orientações clínicas sobre o diagnóstico ou o tratamento.

O primeiro estudo, “Disponibilidade de diretrizes de tratamento da endometriose específicas para cada região: uma revisão global exploratória”, revela disparidades na disponibilidade de diretrizes e tratamento deste problema que são específicos para cada região em todo o mundo, com mais de um quarto dos países sem qualquer recomendação clínica disponível publicamente: apenas 7% têm diretrizes clínicas oficiais endossadas pelo governo.

Em muitos países, as únicas orientações regionais para o tratamento da endometriose identificadas provinham de fontes informais, como sites de defesa de direitos ou redes sociais, o que contribuiu para grandes inconsistências nos cuidados. E, embora a Europa apresente a maior disponibilidade de diretrizes, muitos países de baixo e médio rendimento tinham pouca ou nenhuma orientação formal para os profissionais de saúde ou para os doentes.

A primeira autora deste trabalho, Devon Evans, professora assistente na Universidade de Manitoba, considera que estes resultados “mostram que muitas pessoas que vivem com esta condição crónica procuram cuidados em regiões onde não existem recomendações oficiais”.

“O acesso a diretrizes de tratamento baseadas em evidências, culturalmente relevantes e aplicáveis ​​localmente é fundamental para melhorar os resultados no tratamento da endometriose”, acrescenta a autora sénior, Stacey Missmer, Vice-Presidente de Investigação em Obstetrícia e Ginecologia da Universidade de Michigan.

A coautora sénior Linda Giudice, professora de Obstetrícia, Ginecologia e Ciências Reprodutivas da Universidade da Califórnia, em São Francisco, e ex-presidente da Federação Internacional das Sociedades de Fertilidade (IFFS), acrescenta que “a revisão e a modificação locais das diretrizes de cuidados existentes, provenientes de países com populações ou estruturas de sistemas de saúde comparáveis, poderão impulsionar rapidamente a sensibilização e a implementação de cuidados eficazes focados na endometriose em todo o mundo”.

Poucos países com políticas de apoio

O segundo estudo, “Políticas e sistemas de cuidados para a endometriose: uma revisão global abrangente”, constatou que metade de todos os países não tem qualquer informação sobre as políticas disponíveis. No entanto, 96 estavam a promover a sensibilização para a endometriose como um problema nacional, 48 foram mais longe, colocando a endometriose na agenda política, e 12 nações adotaram políticas para uma estratégia nacional de endometriose. Apesar da escassez global de quadros políticos para a endometriose, a revisão destaca exemplos promissores, como os planos de ação nacionais da Austrália e de França, que estão a ser implementados e avaliados.

Tatjana Gibbons, uma das autoras deste trabalho e especialista do Departamento Nuffield de Saúde da Mulher e Reprodutiva da Universidade de Oxford, considera que, “apesar da crescente consciencialização sobre a endometriose, enfrentar os desafios de quem vive com a doença exige estratégias nacionais coordenadas, desenvolvidas em colaboração com os decisores políticos, os defensores e as próprias doentes, para reduzir o seu impacto global”.

“Embora o impacto pessoal e socioeconómico substancial da endometriose seja evidente, existem enormes disparidades na disponibilidade de políticas que auxiliem no cuidado de pessoas com a doença em todo o mundo”, refere a autora sénior, Krina Zondervan, Chefe do Departamento Nuffield de Saúde da Mulher e Reprodutiva da Universidade de Oxford e codiretora do Centro CaRe de Endometriose de Oxford.

Já David Adamson, coautor sénior e presidente do Comité Internacional para a Monitorização de Tecnologias de Reprodução Assistida, acrescenta que “a falta de políticas de saúde significa que os doentes e os médicos não têm recursos ou requisitos fundamentais em que se basear; potencialmente alargando as barreiras socioeconómicas, geográficas e clínicas ao acesso aos serviços necessários para o tratamento da endometriose”.

Os autores apelam aos governos, às sociedades médicas e aos grupos de defesa dos doentes para colaborarem na criação, manutenção e promoção de padrões claros e específicos para cada região no tratamento da endometriose, esforços que, afirmam, são essenciais para reduzir os atrasos no diagnóstico, melhorar a qualidade de vida e garantir o acesso equitativo ao tratamento em todo o mundo.

Da sensibilização à ação: o apelo a uma resposta global coordenada

Um editorial complementar da revista The Lancet afirma que este é o momento de passar “da sensibilização à ação”, instando os governos a tratarem a endometriose como uma doença crónica que exige uma resposta nacional coordenada. Num segundo editorial complementar, a OMS declara reconhecer o impacto da endometriose no bem-estar físico, mental e socioeconómico, e que é necessário demonstrar que a existência de políticas e orientações se traduza em impactos substanciais que melhorem a vida de milhões de pessoas com endometriose.

 

Crédito imagem: Unsplash

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