Será que uma ida ao dentista o pode salvar de um problema cardíaco? A medicina tem muito a dizer sobre a forma como a saúde cardiovascular é influenciada por aquilo que colocamos na nossa boca e não é por acaso que os alimentos gordos e açucarados, os cigarros e o álcool surgem associados aos problemas cardíacos. Mas e o que acontece na própria boca e com os dentes?
“Há, de facto, uma associação”, afirma Andrew Waxler, cardiologista do Penn State Health Medical Group, que confirma que as pessoas com infeções dentárias não tratadas têm 2,7 vezes mais probabilidades de ter cardiovasculares, como doença arterial coronária, do que as pessoas com bocas saudáveis, mostra um estudo de 2016 publicado no Journal of Dental Research.
Mas como se processa a associação entre a saúde oral e a saúde do coração é ainda um mistério.
Há muito tempo que os cientistas conhecem a ligação entre a saúde oral e um tipo específico de problema cardíaco, refere Waxler. “Há anos que sabemos que as pessoas que têm infeções na boca – como cáries e outros problemas – correm um risco maior de contrair o que se chama endocardite”, afirma. “É uma forma elegante de dizer infeção da válvula cardíaca.”
Estas válvulas são as pequenas torneiras no coração, que ajudam a manter o sangue a fluir entre as câmaras, sem refluxo. Uma infeção pode causar uma série de sintomas, como falta de ar e dor no peito e é potencialmente fatal. Os casos ligeiros de endocardite podem ser tratados com antibióticos intravenosos, mas nalguns casos pode ser necessária cirurgia.
E pode apanhar-se com uma dor de dentes? “As pessoas podem apanhar bactérias estreptocócicas da boca que entram na corrente sanguínea, descem e fixam-se nas válvulas e causam uma infeção”, afirma o mécico.
Podem os problemas com os dentes causar ataque cardíaco?
Mais recente para a ciência médica é a descoberta de que as pessoas com problemas dentários têm um risco significativamente maior de desenvolver problemas não só nas válvulas cardíacas, mas também nas artérias. É possível estabelecer uma ligação entre as infeções na boca e o endurecimento do sistema que transporta o sangue rico em oxigénio para os órgãos vitais.
O endurecimento das artérias ocorre quando há uma acumulação de substâncias gordas no interior das paredes destes vasos sanguíneos, o que leva a um bloqueio e, por fim, a um ataque cardíaco. A propósito, o material que bloqueia as artérias é chamado de placa bacteriana, mas é um tipo de substância completamente diferente do tipo que reveste os dentes e causa cáries, explica Waxler.
Comer muitos alimentos açucarados ainda pode levar a problemas cardíacos, mas não desta forma. O fator de risco número um para as doenças cardíacas é a diabetes.
Então, qual é a ligação entre a cárie dentária e os bloqueios arteriais? Os médicos ainda não têm a certeza, mas têm teorias. A primeira é a de que as bactérias que infetam as gengivas e os dentes, muitas vezes estreptococos, podem ser de outras variedades e podem entrar na corrente sanguínea e nas paredes das artérias.
Segunda teoria, a da inflamação: quando as pessoas têm uma infeção crónica, por exemplo, nas gengivas, podem surgir inflamações crónicas associadas noutros locais.
Nos últimos 30 anos, a investigação tem demonstrado que as pessoas com níveis mais elevados de inflamação no corpo têm maior probabilidade de sofrer ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais. A ideia é que quando as pessoas têm uma infeção na boca podem desencadear uma resposta inflamatória no corpo. Em resposta, o sistema imunitário pode tornar-se demasiado agressivo e o endurecimento das artérias é o resultado de uma irritação causada por essa resposta.
“Para mim, isso faz mais sentido do que as bactérias”, refere Waxler.
Terceira teoria: um acidente. As pessoas que não cuidam dos dentes têm mais probabilidades de ter maus hábitos que conduzem a doenças cardíacas. Neste caso, os problemas arteriais não têm nada a ver com bactérias ou inflamação e a associação entre a saúde dentária e a saúde do coração reside no facto de as pessoas com problemas dentários graves também poderem fumar ou comer alimentos que são maus para elas.
Ir ao dentista é sempre uma boa solução
“Se decidir ir ao dentista de três em três meses e decidir que vai ter a boca mais limpa do mundo, isso ajuda o seu coração?” pergunta Waxler. “Não sei se alguém tem realmente a resposta para isso”.
O que os médicos têm a certeza é dos cinco grandes fatores de risco: a diabetes, o tabagismo, o colesterol elevado, a pressão arterial elevada e uma história familiar de doença cardíaca, que são fatores de risco para a doença cardíaca. Se está a tentar prevenir uma doença cardíaca, tem de pensar em alguns culpados mais prováveis antes de se preocupar com os seus dentes.
O que diria Waxler a uma pessoa preocupada com o facto de os seus dentes poderem um dia dar uma dentada no seu coração? “Eu dir-lhes-ia para irem ao dentista pelo menos uma vez por ano, idealmente de seis em seis meses. Escovem os dentes, usem fio dental. Existe uma correlação direta. Não sabemos porquê. Mas mal não faz, certo?”