
Se, até recentemente, este não era um tema muito estudado ou debatido, os últimos anos mudaram o cenário, ao confirmar que os sistemas de saúde têm um impacto ambiental de 4,4% nas emissões de gases com efeito de estufa (GEE), contribuindo para agravar a crise climática. Em Portugal, o número é ainda superior: 4,8% das GEE são geradas pelo setor da saúde. Aqui, os inaladores pressurizados (pMDI), dispositivos médicos utilizados para a administração de medicamentos nos pulmões das pessoas com asma e Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), têm um impacto importante que não é, no entanto, reconhecido por quem os prescreve.
Um inquérito promovido pelo Conselho Português para a Saúde e Ambiente (CPSA), junto de 348 médicos, confirmou isso mesmo: apenas cerca de metade (52,3%) afirmou ter conhecimento sobre a pegada ambiental dos inaladores.
Não só são muitos os que desconhecem esta realidade, mas entre os profissionais das áreas de Pneumologia, Alergologia, Medicina Geral e Familiar e Medicina Interna, auscultados neste estudo, há 15% que identificam de forma errada os inaladores de pó seco (DPI) como sendo os mais poluentes, quando esta é uma caraterística dos pressurizados.
Além disso, a larga maioria (mais de 70%) diz não considerar aspetos ambientais ao prescrever inaladores, não obstante isso estar preconizado nas guidelines internacionais de tratamento para as doenças respiratórias.
“É urgente um maior envolvimento dos profissionais de saúde no combate às alterações climáticas e à degradação ambiental, como uma responsabilidade ética e profissional, na medida em que os fatores ambientais já são responsáveis por uma em cada quatro mortes a nível global”, refere Luís Campos, Presidente do CPSA.
“As pessoas com doença respiratória estão, precisamente, entre as que mais sofrem com a crise climática e a poluição ambiental, por isso é crítico que os profissionais de saúde tenham em consideração o perfil ecológico das tecnologias de saúde que prescrevem, sob pena de estarem a contribuir para o agravamento da condição clínica dos seus doentes, com o dano causado ao planeta e à natureza”, acrescenta.
Desconhecimento face ao impacto dos inaladores
Os resultados do inquérito revelam, ainda, que Medicina Geral e Familiar é a especialidade que afirma ter menor conhecimento sobre a pegada ecológica dos inaladores – apenas cerca de 40% dos inquiridos a conhece –, enquanto Pneumologia se destaca como a especialidade com médicos mais informados sobre esta realidade (+60%).
Os mais jovens referem ter menos informação sobre este tema (pouco mais de 40% afirma ter conhecimento), face aos profissionais com idades entre os 50 e 65 anos (mais de 60% sabem sobre este assunto).
Na hora de prescrever, Pneumologia e Alergologia estão equiparadas nas preocupações ambientais (cerca de 35%), enquanto Medicina Interna é a especialidade que revela menor atenção (~22%).
Recorde-se que, de acordo com o Documento de Consenso “Recomendações para a redução do impacto ambiental dos inaladores em Portugal”, publicado em setembro na revista científica Acta Médica, os inaladores pressurizados representam 95% da pegada de carbono total da terapêutica inalatória em Portugal, enquanto os inaladores de pó seco, somente 5%.
O impacto ambiental dos inaladores pressurizados é, no nosso país, superior a 30 mil toneladas de CO2, o que significa que seria necessário plantar, todos os anos, mais de 1,3 milhões de árvores para capturar estes gases da atmosfera. O impacto carbónico dos dispositivos pressurizados, em Portugal, equivale a 150 viagens transatlânticas entre Londres e Nova York ou 2.445 voltas à terra num carro a diesel.
Face a estes resultados, os especialistas elaboraram um conjunto de recomendações:
- a prescrição de inaladores de pó seco em vez de pressurizados sempre que possível;
- a introdução nas plataformas de prescrição de um mecanismo de alerta sobre a pegada ecológica específica de cada inalador;
- a implementação de estratégias para incentivar a devolução dos dispositivos usados nas farmácias, entre outras.