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Doentes com Duchenne nem sempre têm o suporte respiratório de que necessitam

Duchenne

A distrofia muscular de Duchenne é uma doença neuromuscular, rara, que resulta da incapacidade de o organismo produzir uma proteína fundamental para o funcionamento do músculo e que deve o seu nome ao neurologista francês, Guillaume de Duchenne que, na década de 1860, a descreveu com algum detalhe. E se, até muito recentemente, esta se apresentava como uma sentença de incapacidade total, face à degradação de todos os músculos, hoje, as coisas mudaram. No entanto, há ainda cuidados que falham, como a avaliação da função respiratória.

Progressiva e altamente incapacitante, os sintomas desta doença costumam surgir logo nos primeiros anos de vida, destacando-se, entre eles, atrasos na aquisição da marcha, marcha instável, quedas frequentes, incapacidade em correr ou subir escadas e, em alguns casos, atraso na linguagem e dificuldades de aprendizagem.

A perda da marcha pode ocorrer entre os 8 e os 12 anos ou, até, no início da idade adulta, em função da sua mutação genética. Com uma prevalência de 1 caso para cada 3500 nascimentos do sexo masculino, pode ser diagnosticada de forma cada vez mais precoce, o que permite que a sua evolução possa ser criteriosamente monitorizada, em todas as suas fases, desde a infância até à idade adulta.

Ainda sem cura, são várias as medidas que devem ser tomadas para permitir melhorar a qualidade de vida destes doentes e a sua sobrevida. No entanto, para que isso aconteça, é preciso que se fale sobre Duchenne, que se partilhe informação, que se dê a conhecer aquela que é a causa mais comum de distrofia muscular e as muitas formas de melhorar a vida destas pessoas. A correta, e completa, avaliação da função respiratória é um dos cuidados essenciais.

Melhorar os cuidados dos doentes com Duchenne

O alerta vai agora para a necessidade de melhorar ainda mais os cuidados destes doentes. Apesar de todos avanços, e do muito conhecimento adquirido e partilhado, os desafios ainda são muitos.

À medida que a doença progride, os músculos respiratórios enfraquecem, o que reduz a capacidade do doente em respirar, permitindo que se instale uma grave disfunção respiratória, que pode levar gradualmente à hipoventilação noturna, e todas as suas consequências, tais como esgotamento, dores de cabeça, dificuldades de concentração, oxigenação deficitária, entre muitas outras.

Coisas simples como ver televisão ou videojogos podem tornar-se tarefas difíceis para o cérebro.

Apesar de um consenso alargado entre os especialistas, que recomendam a realização de avaliações completas da função respiratória de seis em seis meses para os doentes com Duchenne em todas as fases, isso ainda não acontece.

De facto, um estudo publicado em 2016 confirma que 71% dos doentes que já tinham perdido a capacidade da marcha não faziam avaliações regulares da função respiratória, com consequências para a sua qualidade de vida.

Miguel Félix, pediatra, coordenador da Unidade de Pneumologia Pediátrica do Hospital Pediátrico de Coimbra e presidente da direção da Sociedade Portuguesa de Pneumologia Pediátrica e Sono, considera que, “além da avaliação da função respiratória, é fundamental intervir nestes doentes em termos de suporte respiratório, de acordo com os standards internacionais de cuidados, através da instituição de ventilação não-invasiva durante o sono, recrutamento de volume e medidas de apoio à desobstrução brônquica incluindo tosse assistida”.

Segundo o especialista, “em contraste com o estudo referido acima, realizado em vários outros países europeus em 2016, os doentes com Duchenne seguidos em Portugal nas Unidades de Pneumologia Pediátrica têm, na sua maioria, avaliação atempada em termos de função respiratória e disponibilidade dos meios de tratamento recomendados. Devem ainda assim ser mantidos todos os esforços para a conseguir que estes cuidados sejam cada vez mais universais e atuais”.

Joaquim Brites, Presidente da APN – Associação Portuguesa de Neuromusculares, reforça a importância destas avaliações. “Há muito tempo que não existem dúvidas de que a qualidade de vida destas pessoas, em qualquer fase da doença e independentemente da sua idade, pode melhorar drasticamente se for acompanhada de cuidados de saúde considerados essenciais e, internacionalmente reconhecidos como “standard”“.

Com isto refere-se “a todas as terapias de reabilitação respiratória, funcional e cardíaca, aplicadas de forma regular. A importância das recomendações dos cuidados, a nível internacional, não pode ser subestimada pelo Serviço Nacional de Saúde, sobretudo quando se trata de prevenir, na infância, uma consequência já conhecida na idade adulta, através de atos médicos simples e não dispendiosos, como a avaliação da função respiratória”, refere.

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