A hipertensão e a diabetes podem afetar negativamente o cérebro antes mesmo do aparecimento de uma doença cerebrovascular, como acidentes vasculares cerebrais (AVC) ou alterações cognitivas, e na ausência de quaisquer sintomas. A descoberta foi feita por um grupo de investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), coordenado por Jorge Polónia e Elsa Azevedo, que abre a porta para a avaliação de um novo marcador precoce e não invasivo de doença cerebrovascular em doentes de risco.
O estudo, publicado no Frontiers in Aging Neuroscience, revela que os doentes com hipertensão arterial têm já uma disfunção significativa na articulação entre neurónios e microvasos sanguíneos no cérebro. Esta conexão entre a atividade neuronal e a resposta vascular é essencial para garantir o normal funcionamento do cérebro.
“Normalmente é necessário aumentar o aporte de sangue às zonas cerebrais que se encontram mais ativas em determinado momento e isso é conseguido pelo mecanismo fisiológico do acoplamento neurovascular, isto é, de articulação entre os neurónios e os vasos sanguíneos que os suprem. Este mecanismo precisa de estar bem afinado para um bom funcionamento cerebral”, explica Elsa Azevedo, professora da FMUP.
Os participantes neste estudo foram submetidos a exames não invasivos de imagem, nomeadamente a Doppler transcraniano para análise dos principais mecanismos reguladores da vasorreatividade cerebral e a ressonância magnética para avaliação do volume de lesões de substância branca no cérebro.
Durante a estimulação visual, verificou-se que “os doentes hipertensos apresentam menor aceleração na velocidade do fluxo sanguíneo na artéria que irriga o córtex visual, apresentando uma resposta mais lenta face ao aumento das necessidades originadas pelo estímulo, bem como uma menor flexibilidade na resposta, quando comparados com pessoas saudáveis, sem hipertensão arterial”.
Em doentes com hipertensão e diabetes, os resultados obtidos foram ainda piores, o que aponta para défices precoces do acoplamento neurovascular, anteriores ao aparecimento de sintomas de doença cerebrovascular.
“Estas descobertas sugerem que os doentes com hipertensão e diabetes têm um atingimento precoce da conexão entre atividade neuronal e resposta vascular. Esse défice é detetável ainda sem existência de quaisquer sintomas de doença cerebrovascular”, explicam os investigadores responsáveis.
Embora a abordagem deste marcador precoce e não invasivo de doença cerebrovascular seja promissora, a equipa da FMUP considera que ainda serão necessários mais estudos antes da sua utilização por rotina na prática clínica.