Cerca de 176 milhões de mulheres em todo o mundo sofrem de endometriose, ou seja, aproximadamente uma em cada 10 mulheres em idade reprodutiva. Em março, mês mundial de consciencialização para a endometriose, o alerta vai para esta condição, cujo diagnóstico é habitualmente demorado e que pode levar à infertilidade.
Dor menstrual (dismenorreia), dor na relação sexual (dispareunia), dor ao evacuar (disquézia) e dor ao urinar (disúria) são os principais sintomas da endometriose, mas há outras dores associadas, como a abdominal ou torácica e cada doente apresenta sintomas e níveis muito distintos de dor.
“A endometriose tem um impacto profundo na vida das mulheres”, refere Tatiana Semenova, ginecologista e especialista em fertilidade da Clínica IVI Lisboa.
“Ao causar dores intensas, diminui a qualidade de vida, interfere com a intimidade nos relacionamentos e pode causar depressão e infertilidade. O tempo médio para o diagnóstico é de quatro a 11 anos, o que pode protelar o sonho da maternidade.”
Ainda de acordo com a especialista, muitas mulheres demoram a procurar ajuda médica porque a dor, menstrual ou a da intimidade, ainda pode ser um tabu.
Testemunho de endometriose na primeira pessoa
De acordo com médica ginecologista, a endometriose consiste na presença do tecido que reveste o útero (endométrio) fora da sua localização habitual. Os focos de endometriose encontram-se mais frequentemente nos ovários, nas trompas uterinas, nos ligamentos que sustentam o útero e no revestimento da cavidade pélvica ou abdominal.
“A queixa mais frequente é dor menstrual ou dor pélvica crónica, mas também podem existir sintomas gastrointestinais ou urinários se os implantes de endometriose invadirem outras estruturas, como o intestino grosso, a bexiga ou o reto”, explica.
A endometriose pode provocar obstrução das trompas, distorção de anatomia pélvica ou formação de quistos ováricos que, em determinadas ocasiões, necessitam de cirurgia, com a consequente perda de tecido ovárico e diminuição da reserva ovárica.
Sara Cardoso Fernandes, 27 anos, conhece bem esta doença silenciosa, diagnosticada em 2018, quando já estava casada e a planear ter um filho.
“Era uma jovem, sem problemas, que vivia intensamente num mundo cor-de-rosa, rodeada de pessoas maravilhosas e de momentos repletos de alegria e felicidade. Os meus sonhos envolviam um casamento cheio de amor e magia. Adivinhava-se, logicamente, um novo pensamento que consistia na materialização da maior dádiva da vida… ter um filho! Mas, 2018 ficava também marcado pela inversão deste ciclo de felicidade, com o diagnóstico de endometriose”, recorda.
Logo nesse ano foi operada duas vezes para excisão de um quisto no ovário esquerdo. No ano passado foi novamente sujeita a uma cirurgia para a excisão de um quisto no ovário direito e de nódulos profundos da endometriose na cavidade pélvica. Em 2019, recorreu a um hospital privado para engravidar. Nenhum dos três tratamentos foi bem-sucedido.
Os medos, as angústias e a tristeza aumentaram, mas Sara não perdeu a esperança apesar de a doença estar bastante avançada. “Questiono-me como foi possível que em consultas regulares ginecológicas não tivesse sido detetada esta doença.”
Mas a persistência e o apoio de familiares e amigos acabaram por devolver a Sara o sonho da maternidade.
Mitos e verdades
Mitos:
É sempre doloroso – Embora na maioria das vezes cause dor intensa, há casos em que pode ser assintomática.
Está ligada ao cancro do ovário – A endometriose é uma doença benigna. É muito raro tornar-se condição maligna.
A gravidez cura a endometriose – Pode sentir-se alívio dos sintomas durante a gravidez, já que a doença “adormece”, mas na maioria dos casos os sintomas voltam após o parto.
É uma doença rara – Esta doença afeta cerca de 10-15% da população feminina. A incidência não pode ser considerada pouco frequente.
Verdades:
Pode causar infertilidade – Quando não tratada, a endometriose pode evoluir, dificultando a gravidez. Cerca de 35% das mulheres inférteis podem ter endometriose. E das mulheres com endometriose, 40% podem sofrer de infertilidade. Daí a importância do diagnóstico precoce.
É hereditária – Não está comprovado, mas parece existir maior probabilidade de a mulher ter endometriose quando há casos na família.