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Ferramenta online permite criação de respostas para argumentos anti-vacinas

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Os adeptos anti-vacinas são muitos e argumentar com estes nem sempre é tarefa fácil. Foi para perceber o que leva as pessoas a acreditar na desinformação sobre as vacinas que uma equipa de investigação, em que participam especialistas da Universidade de Coimbra, fez um estudo que possibilitou a identificação de 11 tipos de formação de atitudes de oposição à vacinação. E, a partir daqui, criou uma ferramenta online gratuita que permite a identificação rápida de argumentos antivacina e, em simultâneo, a refutação desses argumentos de forma construtiva. O objetivo é tornar mais eficiente o combate à desinformação.

Na plataforma onde está disponível a ferramenta, são listados mais de 60 tópicos de desinformação que podem surgir em conversas sobre vacinas, tanto em contexto profissional, nomeadamente em diálogos com doentes, como na esfera pessoal, em conversas com amigos. O trabalho de investigação pretende, assim, abrir caminho para que se desenvolvam mais estratégias de refutação e outras intervenções que respondam de forma mais direcionada à argumentação anti-vacinação.

No artigo publicado na revista Nature Human Behaviour, a equipa de investigação procurou identificar “os atributos psicológicos que impulsionam a crença de uma pessoa que se opõe à vacinação”, contextualiza o investigador da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) e primeiro autor do estudo, Angelo Fasce.

“O problema da motivação anti-vacinação requer uma abordagem que vai além de apontar as falhas nos argumentos: deve considerar também as raízes desta atitude, isto é, os atributos psicológicos subjacentes à crença da oposição às vacinas”, destaca o investigador.

No contexto deste trabalho científico, as atitudes dizem respeito às crenças e ideias que as pessoas vão formando através da interação social e das experiências que vivem. É de acordo com essas atitudes que o ser humano reage de forma positiva ou negativa a pessoas, situações ou objetos.

A hesitação vacinal “é um conceito que abrange um espectro de atitudes, que vão desde a recusa de todas as vacinas até à aceitação da vacinação, ainda que com incertezas em fazê-lo, sendo uma barreira para alcançar uma percentagem de vacinação suficientemente alta que permita proteger as comunidades”, explica Angelo Fasce.

Considerando que “uma das abordagens mais promissoras para superar a hesitação vacinal é o diálogo entre doentes e profissionais de saúde”, os investigadores procuraram identificar alguns padrões de oposição vacinal com o objetivo de apoiar estes profissionais «a aplicar estratégias de comunicação que sejam eficazes para lidar com indivíduos hesitantes, que podem ser influenciados por desinformação sobre a vacinação”, refere o primeiro autor. O investigador destaca ainda que “algumas das formações de atitude de oposição são cada vez mais comuns nas consultas e requerem treino específico para serem devidamente abordadas”.

11 tipos de atitudes, muitos mais argumentos

São, pois, 11 os tipos de formação de atitudes identificadas pelos autores: pensamento conspiracionista; desconfiança; crenças infundadas; perceção do mundo e política; questões religiosas; questões morais; medo e fobias; perceção distorcida do risco; crença no interesse próprio; relativismo epistemológico; e reatividade.

“Esta taxonomia de argumentos é um recurso útil para os profissionais de saúde, na medida em que, para cada um, são apresentadas refutações que podem ser utilizadas quando os pacientes apresentam determinados argumentos, uma vez que esta ferramenta apresenta já como proceder à resposta a determinados argumentos anti-vacina”, explica Angelo Fasce.

A ferramenta foi feita “em parceria com médicos do Reino Unido e permite que os profissionais identifiquem a raiz do argumento do paciente que recusa a vacinação e, em seguida, definam como podem refutar esse mesmo argumento, sem desafiar o paciente, fazendo a refutação de forma construtiva”, clarifica.

Para validar as 11 tipologias identificadas, os autores recorreram a algoritmos de processamento de linguagem natural, através da combinação de codificação humana e de aprendizagem automática. Realizaram uma revisão sistemática de trabalhos científicos já desenvolvidos sobre argumentação anti-vacinas, tendo recorrido também a fact checks relacionados com a vacinação contra a covid-19.

“Os resultados obtidos com esta classificação hierárquica de textos sugerem que podemos recorrer ao conhecimento académico, sob a forma de literatura científica, para aperfeiçoar modelos de inteligência artificial, capacitando-os para identificar mais facilmente as formações de atitudes presentes no tipo de texto que encontramos habitualmente em contextos mais informais”, salienta o investigador

Projeto quer combater desinformação à volta das vacinas

Este artigo científico foi desenvolvido no âmbito do “JITSUVAX”, projeto europeu financiado com mais três de milhões de euros pela Comissão Europeia, coordenado por Stephan Lewandowsky, professor da Universidade de Bristol (Reino Unido) e, em Portugal, por Fernanda Rodrigues, docente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

O “JITSUVAX” pretende analisar a desinformação e o ceticismo em relação à eficácia e à segurança das vacinas, de forma a que esta análise possa vir a apoiar profissionais de saúde, e também os cidadãos, capacitando-os para comunicar de forma mais construtiva, contribuindo, assim, para o aumento da confiança das pessoas na vacinação em prol da saúde pública.

O coordenador geral do projeto, Stephan Lewandowsky, explica que “a desinformação sobre vacinas tem consequências graves para a sociedade. Foi recentemente publicado no Canadá, por exemplo, um relatório que estima que o custo da desinformação no país ronde os 300 milhões de dólares, com quase 3000 óbitos associados à relutância das pessoas em serem vacinadas por estarem mal informadas. É por isso essencial, para a garantia da saúde pública, encontrar soluções que protejam o público desta desinformação. O projeto JITSUVAX, financiado no âmbito do Programa da UE Horizon Europe, desenvolveu ferramentas para que possamos compreender e combater a desinformação anti-vacina”.

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